Sempre me pergunto se eu quero mesmo
lidar com Direito por toda a minha vida. Não é que eu não goste. Muito pelo
contrário. Direito é uma ciência interessantíssima, e acho que todo mundo
deveria ter noções básicas sobre. Mas me falta a paixão.
A paixão que eu tenho pela literatura,
por exemplo. O prazer que sinto em ler um livro e escrever uma resenha sobre.
Ou o interesse que sinto por psicanálise. Ou a vontade que tenho de reviver as
aulas de História do ensino médio. Ou o amor que tenho pela filosofia.
Mas aí surge outra questão importante:
será que eu teria essa mesma paixão por tudo o que citei se elas me fossem
impostas? Se eu dependesse delas para ganhar a vida?
Talvez o meu “problema” com Direito
seja justamente o fato de ele, no mais das vezes, me ser imposto. Passei 5 anos
estudando essa bagaça, outro tanto estudando para concursos. Por isso, a
sociedade me cobra que eu faça algum proveito disso. Proveito material, bem
entendido, porque para a maioria das pessoas, ter conhecimento, por si só, pelo
simples fato de gostar de aprender, não conta.
E existe uma questão de orgulho
próprio envolvido nisso. Toda vez que me passa pela cabeça largar o Direito e
fazer outra faculdade, uma voz me diz: “vai desistir então?”. Você acaba
encampando aquela idéia de “nossa, passei 5 anos me dedicando a isso, agora vou
jogar fora todo esse esforço?”. Isso está ligado à eterna pressa em que
vivemos, à correria da modernidade. Estamos sempre correndo para chegar o mais
depressa possível a algum lugar. O problema é que não temos a mínima ideia de
que lugar é esse.
Talvez o que mais me incomode no
Direito sejam seus profissionais, não a ciência em si (que, repito, é das mais
interessantes). É um mundinho muito restrito o desse pessoal; todos enfiados em
seus casulos e cheios de si, presos a seus preconceitos e provincianismo. Vide
a famosa questão de se chamar qualquer profissional dessa área de doutor. Eu me formei com gente que nunca leu um livro na vida, que não se interessam por política, que não apreciam música, que só assistem aos filmes que são lançamentos para não ficarem sem assunto, enfim, que não têm um pingo de cultura, mas que se acham o suprassumo da humanidade, por relevantes motivos como estar cursando Direito, ser de família "tradicional" (feudalismo manda abraço) ou usar ternos caros. Entendam: o problema não é a pessoa não ser lá muito culta - seria bobagem da minha parte exigir isso das pessoas, ainda mais num país como o Brasil, em que a educação não é lá essas coisas -, mas se achar especial quando não tem nenhum motivo para isso.
Nessas horas, procuro pensar que não
se pode misturar as coisas. Sim, muitos que cursam Direito são grandessíssimos
babacas. Mas o Direito não pode ser penalizado pelas práticas de seus
operadores. Seria como largar sua religião porque o padre da sua cidade não lhe
agrada.
Outrossim, é curioso pensar que meu
dilema é o oposto de pessoas que fizeram outros cursos. Na minha graduação
estudei com gente formada em Odonto, Farmácia, Administração, Engenharia,
Jornalismo, Matemática. E a maioria desses estava cursando Direito porque
gostaria de ganhar mais. Até gostavam de seus cursos originários, mas se
sentiam pouco recompensados financeiramente. Até eu que tenho um discurso de
que dinheiro não traz felicidade compreendo essas pessoas. Não ganhar
proporcionalmente ao seu esforço deve ser das coisas mais tristes. O x da questão
nessa história é o conceito de “ganhar bem”. As pessoas costumam ser tão
gananciosas que, se o que ela ganha não der para ter uma casa enorme, um carro
0km, jantar nos restaurantes mais caros, comprar roupas de marca e ter todas as
tecnologias de ponta, dizem que seu salário não é “digno”.
Enfim, tenho muito medo de, daqui 20
anos, olhar para trás e pensar: eu deveria ter feito outra faculdade. Alguma
que me despertasse paixão.
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