domingo, 16 de junho de 2013

Porquê virei à esquerda - II


          O tempo passou e eu sofri calado, fui embora da minha cidade, fui fazer faculdade em outro estado. Em termos de pensamento político, lá eu me senti em casa. Morava numa cidade muito conservadora (pra vocês terem ideia, lá, em 2010, o Serra teve 70% dos votos no 2º turno). Fazia o curso mais conservador da universidade, Direito. Estava tudo encaminhado para eu me tornar um reaça convicto.

          Mas a vida tem dessas ironias. Foi justamente num meio assim que eu enxerguei a luz.

          Preciso abrir um parênteses. Hoje eu vejo que, na minha essência, eu sempre fui de esquerda. Em 2002, época em que eu não lia jornal, eu fiz campanha pro Lula. Sempre me incomodou o fato de que o dono de uma empresa ganha mil vezes mais que seus funcionários (devo estar chutando baixo ainda). Nunca achei normal a exploração do homem pelo homem. Nos costumes, sempre fui liberal. Nunca concordei com o fato de que um cara que transa com várias mulheres é o fodão e a mulher que faz o mesmo é a vadia. Nunca tive como meta de vida ser rico, nunca achei que dinheiro traz felicidade.

          Meu alinhamento com o discurso de direita da grande mídia se dava no campo da economia e da moralidade pública. Se todos eles diziam que o PT queria amordaçar a imprensa, eu acreditava e repetia. Se todos eles diziam que o governo do PT era o mais corrupto da história, eu acreditava e repetia. Se todos eles diziam que a inflação estava descontrolada, eu acreditava e repetia.

          Em suma, o que eu quero mostrar com esse parênteses é que eu nunca fui um direitista/conservador modelo. Lá no fundo do meu ser, soterrado por esses discursos, eu tinha ideias que são de esquerda. Fecha parênteses.

          Tudo começou quando eu fui fazer estágio num escritório de advocacia que trabalhava majoritariamente com direito do consumidor. Era um ramo do Direito novo para mim, então eu precisei estudar. E estudando direito do consumidor, vários dogmas do liberalismo econômico, que já estavam enraizados em mim, foram ruindo. Ideias como a de que o Estado não deve intervir na economia, de que o mercado se autorregula etc. Ali acendeu uma luz vermelha.

          Mais ou menos na mesma época, eu descobri o blog da Lola (tem o link ali no canto direito). Mudou a minha vida. Lá eu descobri o que era o feminismo. Não tinha nada a ver com a visão deturpada que o senso comum e os conservadores querem nos passar. Lá também foi a primeira vez que eu li pontos de vista diferentes dos que eu estava acostumado sobre política.

          Por fim, veio a cereja no bolo. Eu fui mandado embora. Neste escritório, o chefe fazia questão de frizar que éramos uma família, que no que a gente precisasse poderia contar com ele. Com minha demissão eu percebi que não existia família porra nenhuma, que eu era apenas uma peça numa engrenagem, peça que poderia ser substituída a qualquer momento por qualquer motivo. Aliás, a convivência diária com TODOS os chefes que eu tive foi importantíssima. Todos eram ricos. Um já tinha nascido rico, os demais eram pobres, mas, com muito esforço (e como eles adoravam contar suas histórias de superação), também se tornaram ricos. Era foda ver a visão esnobe que eles tinham sobre muitas coisas. Todos odiavam o Lula.

          Um pouco antes disso, eu já havia percebido o quanto os escritórios de advocacia exploravam os estagiários e os recém-formados. Você faz o trabalho todo, dá o sangue, e no fim quem leva o dinheiro são os sócios do escritório. Isso me indignava, mesmo eu não tendo lido Marx e não sabendo o que era mais-valia (até hoje não li e não sei rs). O mais trágico dessa história é que tem gente que diz: ah, o mundo é assim mesmo, se você se esforçar bastante, um dia vai ser você que vai ter o escritório e vai poder explorar os estagiários.

          Para terminar, quero esclarecer que não acho que quem é de direita/conservador é um alienado como eu fui. Existem casos e casos. Há quem seja direitista convicto, que encarna todos os valores. Eles sabem que existe uma mídia alternativa, mas não querem saber dela. Esses eu respeito. Mas também existem os que vivem numa situação parecida com a minha, que até hoje não descobriram como a grande mídia é tendenciosa. Desses eu tenho pena.

          O que mais chateia nessa história toda é ver que o governo do PT, o que mais sofre com essa oposição da mídia, nunca teve interesse em fazer o projeto do marco regulatório andar. Por essas e por tantas outras estou convicto: ano que vem a Dilma não vai ter o meu voto no 1º turno. E no 2º vou votar nela com o coração apertado.

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